domingo, 10 de julho de 2011

Pra repensar.

     E nas ruas que antes secas e estridentes, onde nadavam outrora em um mar de poeira, agora se via o restolho suburbano, indagando lamentavelmente, aburridos de suas vidas mesquinhas.
Logo ali, mais a frente, onde as vistas custam a enxergar, escorregadios na enxurrada imunda das gotas escassas que caiam do céu triste e carregado que ainda ontem fora voraz e medonho se esbaldavam gatos pardos atrás de ratos fartos que futricavam entre os trapos.
       - Eu via da janela. Eu via a vida.
     Ainda me arrepiam os assobios tristonhos do vento que adentravam minha sala úmida e fria, e os estrondosos trovões, os trovões que tilintavam a louça na prateleira, abastecendo ainda mais a sinfonia do medo que pairava por ali.
     Minha prateleira, herdada de minha avó, que herdara também de sua avó, capengava ali no cantinho, solitária e empoeirada, tão mais triste que minha poltrona velha e rasgada, cor de mofo, creio que outrora ela fora verde seco.
     Agora lá do lado de fora a moça do vestido dégradé, quase cinza, que outrora penso ter sido branco ou de um bege clarinho, entregava pães quentes a esposa loira e peituda de seu amante velho e gordo e rico.
      - Eu via.
     Essa tal moça peituda, ainda pouco se via em um cabaré, rodeado de outras tantas meretrizes, fartando-se de uísque quente e cigarros bancados por magnatas que ali deixavam herdeiros bastardos, que depois mais grandinhos faziam sua própria vida assaltando os ricos pais e moribundos.
       - Eu via a vida. Nua e crua naquela época... Mais nua do que crua!
     - O marido? Esse era um banqueiro fedido e gordo que só de bom tinha o dinheiro, desviado do banco por sinal, fumando seu cachimbo negro reluzente, e de forma escrota coçava o saco vagarosamente indiciando que a noite pra sorrateira senhorita dos pães, que lhe fitava descaradamente, que sua noite ia ser longa, mas bem lucrativa, já que era ele que lhe pagava o pensionato, para ela e seu irmão mais novo, com seus vinte e poucos anos.
     Mais adiante na esquina, onde o sol sempre caia cansado de olhar para aquele lugar, sentada na varanda de madeira oca e esfarinhada pelos longos anos de cupins, estavam duas senhoras, uma crente e outra fervorosa, com seus peitos caídos, e vestidos estampados, de nariz empinado, cochichando sem notar o rapaz a reparar as indecências que falavam.
     O rapaz engomadinho, talvez de uma delas fosse o sobrinho, esse ainda pouco era um moleque, agora de pileque ia com alguém se encontrar, a velha mais fofoqueira, disse outra asneira dando tempo dele a escutar.
      “- Ele não perde um rabo de saia.”
       Se bem soubesse a velha senhora, com quem o rapaz namora, nada ia comentar, apressadinho ao pensionato o rapaz se adentrada, ao quarto da moça dos pães foste bater. Um minuto depois...
       - Eu vi quem foi atender, mas prefiro não comentar, você vai ficar a imaginar.
Desviando o olhar agora, encarando a vidraça mais a frente, pude notar um velho a balbuciar palavras descontentes, resmungos incoerentes sobre a vida agitada daquele lugar, se bem lúcido estou ainda a reparar, pensei em acreditar ter um irmão gêmeo.
      -Eu o vi olhando pra mim.

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