quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Sou eu quem se perdeu.



Eu sei que você dormiu abraçada aquela coberta que ainda guarda o perfume incomum e que ao fechar os teus olhos cansados admirou a imagem de dois corpos que viviam o deslumbre de tempos que pareciam gloriosos e eternos, esses dias eram bem mais cheios de cor e calor, comparado a estes dispostos hoje frios, desbotados e temperamentais, perderam se ali duas almas dispostas ao infinito.

- Agüente firme mais um pouco, ainda é cedo pra chorar.

 Poderia ser uma noite quente em que esta companhia muda não lhe trouxesse tanto conforto quanto outra hora lhe fizera ao aquecer os pensamentos fartos, deixando-a resguardando pelo dia seguinte quando a insônia ansiosa lhe fazia desejar que a noite fosse curta e que o dia seguinte ao lado de seu “amor” fosse o mais longo possível, eu sei que, contudo ainda assim, se entrelaçaria a ela buscando qualquer vestígio de quem já se foi há algum tempo, mesmo que aquilo ao seu raciocínio orgulhoso lhe atirasse a falta de orgulho, o perfume brando ainda lhe faria estremecer e chorar pedindo ao vago quarto que vocês voltassem a se unir.

- Respire fundo, e percebera que este aroma te levará as memórias que talvez estivessem perdidas.

Eu sei que parecem anos, mas foi só há algumas horas apenas que ela lhe deixou em pranto largada de forma qualquer, cabisbaixa a mercê de qualquer lapso insano que lhe parecia lógico e fácil naquele momento. Comigo também foi assim, eu queria saídas fáceis e até mesquinhas, nada corajoso diga se de passagem, mas na medida em que podemos ficar bem, vem surgindo sorrateiros sentimentos e fagulhas de imagens de dias mais alegres que estes, e é nesta hora que encontramos o que nomeamos como “a dor do vazio”, desde que chegou ela vêm se impondo a mim mostrando ser superior a qualquer outra sensação existente aqui, não se podia mais sorrir, se alegrar, ter prazer ou até mesmo chorar sem que ela preenchesse o incalculável espaço vago em mim, o vazio se tornando dor, e a dor sendo conseqüência daquele vazio crônico.
Se lhe pedem explicação do que sentes você elabora qualquer diálogo fadigado de filme mexicano dublado, ou de um drama trágico francês e diz mentindo sem chance de credibilidade pelo espectador adiante que esta adoentada, fadigada do trabalho, que tem tido insônia, que lhe falta um pouco de apetite, que o mau humor ou a alta taxa de sensibilidade emocional é causado por uma TPM que já vem fazendo um ciclo vicioso nessas últimas três semanas, enquanto na verdade a garganta arde apertada e a boca amarga deixa sem graça teu prato favorito ao paladar, o peito queima acelerado te fazendo ficar acordada a lucidez de pensamentos bons que se tornam ruins e confusos, teu corpo parece soluçar as dores de cada batimento daquele coração dolorido, sua mente esta tão cansada que você só se concentra em achar razões quaisquer para dar lógica a toda aquela cena de fim, maldito desamor que nos vai deixando sem razão.

- Desate o último botão da camisa e respire devagar, não deixe que seus olhos lacrimejados molhem teu rosto e estraguem sua maquiagem pesada, ajeite teu cabelo e erga o queixo rumo ao céu, se quiser pode me abraçar.

Enfim, seu corpo agora não reage mais tão lúcido ou tão voraz quanto antes, é frustrante eu sei. Não se pode mais controlar tua mente que submerge em um mar emocional desgastante, desconhecido, nosso lado sempre parecerá mais desfavorável ou desconfortável que o do outro, e por fim ainda somos egoístas e orgulhosos, mas é porque nós que quando de corpos viris e almas deslavadas diríamos em outro dia que só se encontra assim quem quer, agora pagamos a língua como bestas inocentes, e dedicamos nossos dias a lamentar injuriada a perda de um membro recente, sim, é como se tivessem me arrancado um braço, ou uma perna, ou qualquer parte que faria grande falta em mim.

- Jamais vacilaríamos ou seriamos desleixados como outros, não existiria um coração a mercê ou jamais seriamos tapete para alguém, este um dia foi o nosso mal.

Em outras palavras ousamos ser quem quiséssemos ser, sem pestanejar a reação decadente de alguém, é apenas desdém por algo que não encontramos ainda, que nem ao menos sabemos o que procurávamos, quando não se conhece não se deseja e se não deseja não lhe faz falta. Apenas não tínhamos noção exata das proporções que tais sentimentos nos levariam, vivíamos pelo dia pós outro, e agora mendigamos milésimos de segundos que nos levariam a uma inconsciente realidade não tão boa, nada parecida com o que realmente sonhamos.

- O problema é experimentar!

            A quem se sujeitasse a nossa língua ou ao nosso vaivém de quadris que não esperasse imediata aspiração ao mundo lógico de nossos sentimentos, afinal não somos tão coerentes como a maioria aparenta ser, sendo assim talvez não existisse uma noite pós outra, ou uma troca de telefonemas ou cartas de amor demonstrando a fragilidade do nosso ser a qualquer um que premeditasse atar suas mãos as nossas e que não mais nos permitisse idealizar a liberdade solitária que queríamos, eu sei bem que ao final seriamos taxados de desprezíveis, frios, assentimentais, quando na verdade somos escarnados gêmeos piscianos de incalculável sensibilidade, sonhadores sem limites. Nas horas de apelo, quando o ego está ferido e o corpo desanimado, nossa mente sem perspectiva nos leva a desejar qualquer sensação semelhante do que vivenciamos. Agora que nos encontramos distante de sermos frias frígidas almas desbotadas lamentamos o desdém de quem nos mostrou o amor e em seguida nos fez querer “desamar”, e por passar a ser crente em qualquer coisa que nos tirasse daquela queda livre em uma fossa obscura começamos a recorrer a qualquer ajuda divina ou até mesmo a uma cartomante daquelas de esquina, que nos fizesse agarrar a idéia de que ao final tudo seria mais uma história de relacionamentos duradouros, que ali não seria um fim aplicável.

- Pode acender um cigarro favorito em comum, eu também conheço sua saudade.

Quando estiver sozinha olhe para o nada e bem diga sobre os bons dias passados quando ainda éramos quem éramos cabíveis de vários pseudos amores simultâneos, esses dias me dão saudade, eles eram tão mais lúcidos que estes, mas não despreze esses dias atuais, em algum outro momento futuro iremos rir de nossas prematuras perdas. Se lhe faz bem pragueje a quem foi embora que sofra ao abandono de outro alguém, de forma cruel e egoísta seja sincera mesmo que enraiveça você ter a certeza de que amará este alguém por um longo tempo indeterminado.
Você ainda sofrerá tremeliques, e perderá a compostura sempre que simplesmente lhe pronunciarem este nome que repetidamente martela em sua cabeça e lhe fere a alma. Depois de longos desgastantes dias, em uma hora ou outra acordará menos mal, vai conseguir rejeitar alguns telefonemas, jogar fora algumas lembranças, ou até mesmo sentir raiva para favorecer o desapego, um dia o cigarro incomum será apenas mais um cigarro, e seus lapsos de tendência suicida serão projetados a uma vaga lembrança de um passado distante e incoerente, talvez nesta hora ao pensar nisso você esteja em uma cama quente e macia, abraçada simetricamente confortável pelos braços de um novo alguém, sentirás um novo tipo de paixão, algo que te esquente a alma e te supri metade deste vazio, por um tempo vai bastar, este novo amor será seu refúgio, sua fortaleza e nele descansará até que esteja pronta para viver outro mesmo amor, mas se vacilar e se perder em pensamentos antigos ainda se pegará chorando por alguém que a face já nem mais lhe é tão nítida, sentirá saudades de alguém que deixou de conhecer, alguém que talvez nunca existiu, estará diante do teu eu vazio.

- Não chore! São apenas cicatrizes.


“Se deixares de acreditar no amor, ai sim lhe chamarei de vazio covarde,
deixe o desamor para os ignorantes desalmados.”



Para minha amiga chorona pisciana.


(Rafael Augusto)

sábado, 3 de setembro de 2011

Entre o que eu quero e o que posso viver.

       Quando me degustei daquela boca insana, mergulhei em proporções que outrora pareciam mais fartas, mas foi ao sentir tua saliva quente viscosa, misturada a cerveja amarga que encontrei em mim memórias frias e severas de final de julho, era hora de rir escancaradamente para não chorar de covardia.
            Nesta hora o nó que estava atando a garganta me sufocando desde sempre se desenrolava ao buscar a sincronia de uma língua ágil e desesperada, sua dona era solitária visto pelo que apresentara a mim, tinha em si uma silhueta obscura de burguesia boemia e medrosa estagnada a uma vida insegura de prazeres secretos e culposos impostos pela sociedade politicamente correta, isso ainda me fortaleceu o desejo casual de consentir ao pecado teu, aliviando lhe da proposta imposta de suas formalidades sexuais reprimidas, era um espetáculo armado onde as apresentações decorridas deixaram um palhaço despido e deprimido a mercê de um público que mendigava pela graça de alguns sorrisos, mesmo que os mesmo coubessem em um rosto pálido e irônico.
            Em meu íntimo pensamento me martelava a idéia de que o outro que partira há poucos dias agora busca levar contigo de bagagem uma crua realidade hipócrita oferecida de bandeja pela “minha” vaga idéia de sociedade formalista e retraída, me vêm à certeza de que em dias passados este fora bem mais cruel e verdadeiro quando chegava manso me fitando sublime e de forma peculiar, era onipresente mesmo não estando ali, naqueles dias de remanso eu gostaria de ler seus pensamentos, sendo eles os mais serenos ou os mais maquiavélicos que se podia deduzir pelas suas expressões faciais ou seu vago olhar, eu assim poderia sentir-me mais confiante no que dizer na cena seguinte, porém enfim continuei com os cigarros habituais e agora a realidade estava desnudo na cama de alguém, acompanhado e ao mesmo tempo sozinho pra dar ênfase a sensação melancólica de saudade, enfim era mesmo covardia misturada a desespero que nos atirava a um abismo de clichês que nem ao menos fazem sentido.
            Quando buscava conforto em mim, estava apegado a uma figura real que lhe fartava determinados anseios, mas acho que mesmo assim ainda buscava outros, eu fui assim por um tempo teu porto imponente seguro e continuei tentando outras soluções para o que fazia falta a tua idéia de bons sonhos em dias de pranto. Depois com o tempo de certa forma fui desaparecendo em finais de tardes fadigadas onde as coisas não mais passavam do casual, um café, um cigarro, cinco minutos de companhia, daí então me perdi em meados de memórias quentes de um inverno frígido de fim mês, agora estou embaraçadamente desconfortável roçando em uma pele que nem era tão quente e que nem ao menos fazia desatar de meu mundo passado, pessoal e peculiar. 
            Minha boca amarga o último gole destemido depois de desprendido da língua fervorosa que percorria as minhas extremidades mais intimas nuas, a noite era quente, mas naquele espaço sem fim habitava mesmo era uma frustração gélida, depois do carnal vêm à sensação de continuar estagnado à mesmice dos desejos, sozinho entregue ao clichê de acender um último cigarro antes que a noite termine, antes que eu vista roupa para partir, “até nunca mais”, pretendo tentar dormir subitamente e crer cegamente que ao acordar seria você dormindo profundamente ao meu lado, confortável a mercê de qualquer atitude real, viável as minhas mãos e não mais só em meus sonhos, entre nós só mediria alguns poucos centímetros de respiração tranqüila de um sono pesado arfado de dias mais cansativos, estaríamos enfim vivendo nosso sonho particular, uma a dispor dos cuidados do outro, estaríamos vivendo.
            Tenho pena das almas solitárias que buscam a contemplação da vida no espírito livre e cheio de luxuria de outros, estes encontraram apenas desapego, desconforto o desamor, a realidade estará despida para seus olhos imaturos fazendo com que os sonhos se assemelhem a realidade e nós mesmos não saberemos mais distingui-los, viveremos sonhando ou sonharemos com o gosto da vida, estes que ainda não sabem amar serão solitários sobreviventes da casualidade mundana, pois também não foram amados, se alguém lhes entregasse um coração oferecendo o desconhecido e intrigante emaranhado de sensações agregadas a tal sentimento, se encontrariam boquiabertos de espanto buscando explicações que talvez fossem irracionais ao que lhes foi imposto, é um misto de insanidade e felicidade, de malicia e inocência.
            Agora mais aliviado depois saciar temporariamente o que estava inquieto em mim desde sempre, pude desviar meus pensamentos a idéia absurda de que pós ali viria à calmaria imediata, mas minha lucidez foi tomada depois dos suspiros arfantes e gemidos gritados, pelo ato eu poderia deduzir se não estivesse ali que alguém estaria morrendo, e de certa forma estava realmente, os dois, cada um da forma mais cabível, se perdendo na casualidade assentimental do momento. O erro exato de toda história foi ter me desprendido de meus pensamentos naquele instante, voltando ao realismo da cena do quarto a meia luz, não havia mais clímax, nem tão pouco excitação, nem muito menos haveria romantismo a seguir por minha parte sendo eu quem sempre fui, que este não esperasse de mim a fuga de seu retiro solitário e nada empolgante, em alguns minutos seguintes eu não estaria mais ai, e ao partir não lhe estenderia a mão para tirar-lhe de sua masmorra, nem tão pouco voltaria a afagar-lhe os anseios carnais de uma alma desesperada, o quarto voltaria a ficar vazio, e suas noites seriam a desejar que outras assim não voltassem a acontecer.
           
- Meu nome?
Com um último lapso de coragem e esperança de uma proximidade vaga me ofereceu um sorriso de canto sujeitando-se pela derradeira vez a meu desdém, me indagando. E eu por vez, nem ao menos vacilei, ou repensei no que dizer.
- Me chame de “alguém”.
Ouviu-me pelas costas.
- Adeus até nunca mais.


            “Em cada segundo eu posso criar um novo futuro, mas não posso apagar o que construí de meu passado.”

Rafael Augusto